Martin Amis, reconhecido romancista britânico, após os eventos que sucederam ao 11 de setembro de 2001, tomou a decisão de deixar sua terra natal. A escolha de destino recaiu sobre um pequeno balneário na costa do Uruguay chamado Jose Ignacio. Um lugar, segundo ele: “…to escape the world hum that is too much in our ears now”. Escapar do ‘zumbido do mundo’ talvez seja uma forma especialmente interessante, e claro, talentosa, de definir uma escolha. Um simpático vilarejo de pescadores, cujo nome remonta a um antigo morador da época da conquista espanhola, no qual o ponto mais alto é seu Faro datado de 1877. Ao lado oeste, encontra-se a Playa Mansa e ao leste a Playa Brava. Para os desavisados poderia ser algo totalmente inusitado, sair da cosmopolita Inglaterra para esta pequena praia uruguaia. Nem tanto, pois Jose Ignacio já havia consolidado uma posição no cenário internacional.
Tão fascinante quanto o que torna marcas únicas é pensar o que faz com certos lugares adquiram essa aura. O verão transforma a cidade, as ruas são estreitas e os Porsches largos como constatou o New York Times. Um exclusivo número de turistas e donos de propriedades de veraneio aparecem para aproveitar a última relíquia da costa de Maldonado. Distante alguns quilômetros está Punta Del Este, para aqueles que querem maior agitação ou não se importam em misturar-se entre os simples mortais. Mas Jose Ignacio mantém seu estilo restrito, de tranquilidade e paz, mesmo sendo visitada por banqueiros nova iorquinos, bilionários europeus e estrelas da música e do cinema, justamente por proporcionar esses momentos únicos de descanso com estilo, de contemplação com requinte. Mais recentemente grandes empreendimentos imobiliários surgiram para acompanhar a tendência de aumento da procura pelo lugar. Alexander Vik, multimilionário norueguês, construiu a Estancia Vik, um hotel que guarda o luxo, rústico e artístico ao mesmo tempo, próprios da identidade uruguaia. Entre diversos lugares no mundo, em Jose Ignacio ele descobriu o ponto único e mágico em que Saint-Tropez encontra o Wyoming.
Assim como produtos e marcas disputam espaços e atenção em gôndolas, cidades e países também o fazem no imaginário dos turistas e investidores. Do mesmo modo que acontece com os bens físicos, lugares têm uma carga mental de experiência, informações, relatos que constroem a imagem que temos. E estas vão mudando com o tempo. Se olharmos as referências que existiam sobre Acapulco no México nos anos 50, veremos que são muito diferentes das atuais. Recentemente foi publicada uma pesquisa sobre qual é a imagem do Brasil no exterior. Sete elementos centrais foram identificados: sensualidade, energia, dinamismo, glamour, despreocupação, diversão e ousadia. Dependendo de como olhamos, podemos ver oportunidades ou pontos de dificuldade nesses aspectos. Bom lembrar que os produtos e serviços, nossa arte e suas manifestações, a história passada e recente ajudam a construir as percepções externas. E toda vez que inserimos o selo made in Brazil, colamos uma parte desses conceitos junto às marcas. Por isso temos que ter cuidado em como queremos ser vistos e o que devemos fazer para isso.
Todos esforços, constância e coerência de posicionamento ao longo do tempo podem ir modificando percepções. No entanto, sempre parte-se de uma situação inicial, assim mudanças abruptas são mais complicadas de serem executadas. Não se reconstrói o que já passou. Então cabe analisar qual o caminho mais adequado saindo da imagem atual até a desejada. Sensualidade pode soar perigoso em contraste com nosso histórico turístico, mas pode ser um elemento forte para consolidar marcas brasileiras de moda. Despreocupação tem potencial para significar libertação da agitação do mundo moderno, porém tem riscos altos de ser vista como displicência. Outro ponto forte em se tratando de um lugar, produto ou serviço, são as referências e as pessoas envolvidas que acabam por emprestar enorme credibilidade. O caso de Jose Ignacio é emblemático, com celebridades que garantem matérias do NYT ao The Guardian, o que apenas reforça o ciclo e imagem positivos. Além disso, as tendências nas quais parcelas significativas da sociedade buscam maior relaxamento como ponto de fuga para o stress urbano (o crescimento de spas, a moda surfe e o turismo ecológico são alguns expoentes), apóiam a consolidação, atualidade e relevância do posicionamento.
Estrategicamente temos que mapear as potencialidades existentes em cada produto, marca ou lugar. O que já existe ali e tem força para ser uma alavanca de identificação e posição? O Uruguay verificou que sua geografia, seu povo, culinária, história tinham um conjunto único de proposta de mercado: agrupando a beleza dos lagos e das praias, os cavalos e o rebanho em planícies a perder de vista, o cheiro da madeira queimando e da carne lentamente dourando na parrilla e o jeito descomplicado de levar a vida. A partir daí empreendeu a estratégia de comunicar seu país como Uruguay Natural. O destino para quem busca qualidade, tranquilidade e contemplação, sempre mantendo um certo ar de prestígio vinculado à tradição. O Brasil terá uma oportunidade única, com os grandes eventos esportivos de 2014 e 2016, em fixar novos elementos em sua imagem de marca com alta amplificação internacional. Voltando a Martin Amis, certa vez ele brincou dizendo que Jose Ignacio era o paraíso porque não havia cartões postais e mesmo se houvesse, não tinha agência de correios para postá-los. Uma posição única e inteiramente sintonizada com os frequentadores que viajam horas cruzando oceanos para alcançar essa experiência. Quantas marcas conseguem essa distinção? Cabe encontrar nosso espaço, até mesmo longe do zumbido do mundo. Bons negócios!
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