Já se passaram mais de 50 anos do famoso artigo Miopia em Marketing de Thedore Levitt, publicado na Harvard Business Review. Nele eram apresentados cases e um conceito central, as empresas vencedores precisam estar centradas no benefício tirado pelo cliente e não no produto que fabricam. As estradas de ferro não entraram em decadência pela diminuição do transporte de cargas e pessoas. Muito pelo contrário, nunca tantas pessoas viajaram e mercadorias foram enviadas a destinos distantes. Apenas o meio mudou, seja rodoviário ou aéreo. Assim, as empresas que se concentraram no produto (product-oriented) perderam mercado (ou desapareceram). Já aquelas que olharam para o benefício (market-oriented), adaptaram-se e prosperaram. Simples, mas vamos olhar um pouco mais.
Diversas décadas depois, Henry Mintzberg em passagem de um de seus livros sobre estratégia, criticou o que chamou de miopia da miopia de marketing. Ou seja, partir de pressuposto que uma empresa poderia rapidamente transformar-se em qualquer coisa a fim de atender ao novo meio de entregar o benefício do cliente. Em outras palavras, um fabricante de ônibus deveria migrar rapidamente para aviões, para manter-se dentro do benefício de transportes, assim que as pessoas passassem a voar mais do que se deslocar por vias rodoviárias. Desconsiderando completamente o parque fabril, a capacidade de desenvolvimento, os relacionamentos comerciais e de mercado construído, em resumo, as competências residentes na empresa para de fato entregar aquilo que se propõe o negócio.
Estratégia não é apenas olhar para fora, como enfatiza a Escola do Posicionamento, representada principalmente pelas visões de Michael Porter. Mas ver no que de fato a empresa é muito boa e capaz. Assim como a gestão de marca é composta de promessa e entrega, a gestão do negócio tem que encontrar uma posição competitiva que possa ser sustentada por seus processos e pessoas. Basicamente deve haver coerência entre a escolha de vantagens comparativas interessantes para os seus consumidores que sejam coincidentes com seus pontos fortes internos.
Veja o exemplo da Converse, uma marca (e um negócio) que trabalha intensamente uma visão market-oriented. Alia um produto iconográfico, carregado de história e simbolismo, com movimentos e comportamentos contemporâneos. Linhas assinadas, co-branding e a presença nos pés de pessoas certas apóiam sua estratégia e confirmam sua posição de mercado. Por outro lado, a New Balance tem uma clara proposta product-oriented, enfatizando quase que unicamente as características e atributos funcionais de seus tênis. Do lado da Converse é importante uma competência muito forte em marketing e branding, do lado da New Balance de desenvolvimento e tecnologia. Sem essas forças internas em cada um, dificilmente conseguiriam sustentar suas estratégias.
Antes de encontrar um lugar ao sol de seu segmento de mercado, descubra quais são as alavancas mais poderosas que possui. Fique sóbrio o suficiente. O lado visionário e provocador do artigo de Levitt deve ser contrabalançado pelo seu poder crítico em entender os limites para sua ação. Não que deva se conformar com eventuais dificuldades. Mas que evite estender a promessa além da fronteira de sua capacidade potencial.
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