As empresas ficaram bilionárias. As marcas grandes demais. São avalistas de parcela significativa dessa conta. Sozinhas representam em alguns casos 1/3 do valor total do negócio. Uma importância tamanha na valoração de ativos que muitos começam a desconfiar que estamos diante de outra entre tantas bolhas especulativas. Mas por enquanto este não é o ponto. Tudo que se torna imenso e importante, tende a fazer concessões. A popularidade pede maleabilidade. Invariavelmente é assim. As marcas passam a ser alavancas de vendas. E mais vendas. Esqueceram em algum lugar do passado que o princípio essencial do marketing é a criação de valor.
Já falamos sobre a infinidade de escolhas. E de como elas podem nos deixar profundamente frustrados. Assim também estamos quando vemos uma infinidade de opções quase todas indiferenciadas. Um mundo chato, aonde os sorrisos das comissárias são plastificados, as cervejas prometem gelar a alma e as agências vender com ideias criativas. Pensou em marcas, pensou em lugares comuns. Por que estamos dando esse valor baixo às marcas como consumidores? Ora, porque as próprias empresas nos fizeram pensar assim. Aquela promessa de algo único, um modo diferente de ver o mundo, ter mais esperança no futuro. Ficou congelado pelo mimetismo da categoria: falar de design e velocidade nos carros, ou de moda e conforto nos calçados. Quando todos dizem “eu também”, o mercado fica cinza.
O gigantismo e a necessidade de faturar mais alguns milhões amanhã reduz a ousadia. Encurta o espaço para risco. Claro que os consumidores querem pertencimento com as marcas. Mas também buscam exclusividade. E nesta mistura surgem as marcas que colocam a pitada de energia em nossa vida. Abrem aquela janela esquecida. Como disse G. Pascal Zachary, os diferentes que se emaranham, são esses que herdarão a Terra. E fundamentalmente, a diferença envolve renúncias. Vários ‘não’ para poucos ‘sim’. Algumas vendas a menos em troca de valor a mais.
Precisamos de menos empresas que digam Sejam Todos Bem Vindos. E mais marcas que afirmem Não queremos fazer negócios com você. É impossível ser tudo para todos. Alias, até pode se conseguir, e estes casos de exceção são usados como regra (quando nunca deveriam de deixar de ser apenas exceções). Há menos Coca-Colas e Havaianas que você possa pensar. Quem tenta ser tudo, acaba como ninguém. Em um mundo de modelos enlatados e replicados, causa surpresa essa afirmação. Mas quando encontramos alguém dizendo isso com propriedade, admiramos. E se for da nossa turma, mais identificação sentimos. Em seu site, a rede inglesa Pret a Manger tem um aviso muito claro aos que a procuram para franquia: não franqueamos nossa marca, não ligue pedindo, na verdade não gostamos de franquear.
Acreditamos em marcas com personalidade. A popularidade pode ser uma consequência. Mas dificilmente como objetivo funciona. Queremos marcas que deixam tristes os consumidores quando se afastam. E geram grande expectativa e uma alegria às vezes inexplicável quando voltam. Que acertam e erram, pois tudo que parece perfeito demais, parece falso demais. E no final, geram aquela estima tal alguém próximo. Trazem quem admiramos, e afastam o que rejeitamos. Longa vida às empresas que acreditam nisto. E encaram todo dia como mais um para manter esse espírito pulsante. Em certa passagem de Annie Hall, Woody Allen compara o relacionamento a um tubarão. Precisa avançar para estar vivo. Assim são as marcas. Retirem os tubarões mortos da água. E por favor, não insista!
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